Não existe literatura no metrô



Acordo todo dia as 5h da manhã. Deixo meu relógio despertar de cinco em cinco minutos, até ter coragem para levantar, depois me troco, tomo café e vou trabalhar. Basicamente uma rotina que vem se consolidando há um mês.

Chego na estação de metrô e já estou há meio caminho do trabalho. Infelizmente o nosso transporte não é decente. Não importa o quanto os governantes façam propaganda e digam "olha como o transporte público é ótimo, o melhor do mundo." Mentiras e mais mentiras, é degradante.

Mesmo assim arrumo meu espaço no vagão e começo a minha leitura. Para mim não há nada melhor do que ler e esquecer por minutos ou talvez horas de onde estou, e embarcar em uma aventura. Ah propósito o livro que estou lendo se chama "A menina que roubava livros" e por enquanto está ótimo. Hoje foi um pouco diferente, no entanto com o passar das estações foi ficando apertado... Mais apertado... Muito apertado... Até se tornar insuportável, não conseguia mais ler.

Até tentava me esgueirar e achar algum canto, mas o livro simplesmente não abria mais. Nesse meio tempo vi uma mensagem (sem querer) de uma garota no celular dizendo "só sou importante na igreja, sou uma líder, fora dela sou uma pessoa normal." Mais uma vez essa juventude que se acha especial, qual o problema em ser comum? Finalmente me rendi e fechei o livro.

Passaram-se as horas do trabalho, voltei para o transporte público e pude enfim ler novamente, não no metrô é claro, até porque é praticamente impossível, mas no ônibus. Sim caro leitor, ler no ônibus também me deixa enjoada, mas o que posso fazer? Leio até onde dá, deixar de apreciar que eu não vou.

Recomecei e voltei para a Alemanha num piscar de olhos (é nesse país que a história acontece). Teve uma hora em que não aguentei mais, por enjoo e por cansaço e tornei a fechá-lo pela segunda vez no dia contra a minha vontade. Até que uma senhora simpática do meu lado disse:
- Você está gostando desse livro?
- Estou sim, muito.
- Eu li e não gostei, minha filha também está lendo e está gostando mais ou menos, achei muito "parado".
Eu poderia ter encerrado aquela conversa ali, afinal ela tinha ido contra um gosto meu, mas era uma leitora. E quando alguém que gosta de ler nesse país fala com a gente, nós temos que conversar o máximo possível.
- Bom, eu estou gostando, até porque se baseia na segunda guerra mundial e eu acho bastante interessante esse tema. - tornei a responder para não deixar a conversa morrer.
- Eu indico outro livro que acho muito bom, chama-se "O futuro da humanidade", trata sobre preconceitos, você sempre fica com o gostinho de quero mais.
- Quem escreveu? - perguntei
- Augusto Cury, mas é muito bom. - ela já sabia que eu teria o preconceito de tratá-lo como "escritor de auto-ajuda", já estava começando a gostar dela.
- Certo, vou dar uma olhada na sinopse para ver se compro depois.

Continuamos a conversar sobre gêneros de livros do quais mais gostamos, entre eles não pude deixar de citar minha rainha literária Agatha Christie, ela me contou sobre outros romances policiais que tinha lido, até que ela finalmente desafiou a minha inteligência:
- Então... Você já leu 50 tons de cinza?
- Não faz meu estilo, nunca tive nenhuma curiosidade.
Ela sorriu e continuou:
- Eu também não gostei, cheguei a ler 3 páginas, mas é muito mal escrito, não tem história nenhuma.
- Agora definitivamente que não quero chegar perto. - respondi já despedindo-me porque iria descer.

Pronto, eu a adorei. Uma senhora absolutamente formidável.
Coisas que uma viagem literária pode trazer.
Pena que o metrô não consegue nos proporcionar isso. Pelo menos em horário de pico.

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